Bolo de chocolate
Todo ser curioso anseia por uma resposta. A grande questão é onde encontrá-la. Houve um tempo em que era preciso perguntar a outro ser, que certamente um dia havia sido curioso, afinal, não existia Internet e nem coisa parecida antigamente.
Qual seria então a receita do conhecimento em tempos tão difíceis? Digamos que é a mesma até hoje: pegue um pai paciente e acrescente cuidadosamente um filho curioso.
“Pai, por que quando aqui é dia, lá no Japão é noite?”
“É porque a Terra gira.”
“Ela gira, que legal! – um breve silêncio e um olhar distante carregado de incertezas – E como é que ela gira e a gente não fica enjoado?”
“Nós já estamos acostumados. É como o tio Zé. Ele é pescador há tantos anos que nem sente o barco balançar.”
“E o que acontece se a Terra parar de girar?”
Aquela pergunta estava carregada de um medo real de que aquilo um dia poderia acontecer.
“Eu não sei. Ela nunca parou.”
O pai riu e coçou a nuca. Coitadinho dele. Havia cometido um erro grave na enciclopédia paterna: ele havia dito “eu não sei”. Dizer isso é como salgar demais um prato depois de pronto.
“A Terra tem chão?”
“Chão? Como assim?”
“Chão, pai! A gente tá apoiado no chão, então a Terra deve estar apoiada em alguma coisa, não é?”
“Não, filho, ela não se apóia em nada. A Terra simplesmente parece flutuar, entende?”
“Entendi.”
Fingir que entendeu tem dois propósitos. Uma deles é deixar que a resposta se faça entendida pelo tempo e quebrar o constrangimento causado pela falta de entendimento do questionador. A outra é parar de perturbar.
Perguntar e perguntar. Uma resposta, mesmo que bem respondida, abre margem para mais questões – por mais difíceis ou estúpidas que elas possam parecer – é um ciclo vicioso, e como quebrá-lo é um mistério para os pais de todo o mundo.
“Por que a Terra não tem anéis como Saturno?”
“Acho que é por causa da atmosfera ou algo assim . . .”
“É tudo muito complicado, pai. Eu desisto de entender.”
“O que é complicado?”
“A Terra, o Sol, as estrelas. . .”
Vendo a frustração do filho, ele resolveu acompanhá-lo até a janela da sacada, onde a noite quente deixava o céu limpo e repleto de estrelas.
“Filho, pense no Universo como um bolo de chocolate. Quando a sua mãe faz um, você não se pergunta o que tem dentro daquele bolo. Você saboreia cada pedaçinho. Um dia você descobre como ele foi feito.”
Olhando para as estelas, o menino percebeu que teria que buscar as suas próprias respostas, mesmo que para isso tivesse que atravessar galáxias distantes. Felizmente, naquele caso, ele só teria que descer as escadas.
Na cozinha, enquanto sua mãe lava a louça da janta, o pequeno se aproximou.
“Mãe, se o Universo é um bolo de chocolate, quem foi que o preparou?”
Autora: Alessandra Borges